quinta-feira, 3 de abril de 2014

de uma entrevista... carlos fiolhais... "se há governantes que não querem cidadãos, era melhor irem eles embora"... no i...!

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E com que conclusões?

Um factor determinante é a educação. A Revolução Científica e a Industrial exige pessoas educadas. E nós não tivemos escola durante muitos anos, veja-se a geração dos meus avós.

Por isso lhe pergunto se não estamos a perder novamente esse comboio. Uma sondagem recente revelava que mais de 44% dos jovens acham que não têm condições económicas para frequentar o ensino superior...

Nós temos razão para estar contentes com o crescimento da escola. Ela cresceu muito. Eu sou o resultado desse crescimento. Conseguimos debelar as vergonhosas taxas de analfabetismo que tínhamos, mas o nosso problema é na qualidade. Temos a elite, os doutorados, mas se calhar temos de estar descontentes com a escola: formou em quantidade e não conseguiu fazê-lo em qualidade. Aquilo que deu às pessoas não as habilitou a transformar o país. As pessoas em geral não saem capacitadas para transformar o mundo. Só se pode mudar aquilo que se conhece. É isso que faz a ciência. Nós ainda temos muito analfabetismo científico. A maior parte das transformações que conseguimos são importadas. A ciência quando está num sítio age directamente sobre as coisas. É a capacidade, o espírito crítico, a interrogação, isso é que faz mudar a sociedade. Há um progresso mas não é o suficiente.

E nos últimos anos?

Só oiço falar em troikas, olho para os bolsos e vejo o que toda a gente vê: um empobrecimento geral e esse empobrecimento está também a reflectir-se na educação e na ciência. Não houve a capacidade de proteger a educação e a ciência. E se a primeira vinha mais detrás, a ciência é muito recente - é uma criança. Precisava de ser acarinhada. Corre-se o risco de que com este pensamento Excel que só olha à dívida se vá vitimar a ciência. E isso faz-me sofrer porque estamos a hipotecar o amanhã. A ciência abre as portas do futuro. Se prejudicamos a ciência, que estava em crescimento, estamos a deitar fora essas chaves. Muitos jovens cientistas altamente capacitados estão a ser obrigados a ir embora. A nossa maior riqueza são os jovens capazes de mudar. E os melhores estão a ir-se embora.

Mas acha que há cegueira política?

Houve no governo pessoas, primeiro Miguel Relvas e depois o próprio primeiro-ministro, a dizerem que "o português tem uma vocação universalista, são cidadãos do mundo", sem perceber o resultado desse êxodo de cérebros, até do ponto de vista demográfico. Se há governantes que não querem cidadãos, se calhar seria melhor irem embora, em vez de mandarem os governados fora. O discurso foi um pouco emendado, agora diz-se que se quer atrair talentos, mas não se pode fazer as duas coisas: por um lado, expulsar os nossos talentos, por outro lado, tentar atrair outros.

Mas a ciência não é uma produção sem fronteiras?

Claro que é. Mas é um jogo de trocas, e estas têm-nos sido altamente desfavoráveis. Os nossos jovens que saem vão criar nas universidades e empresas estrangeiras. Nós podemos comprar depois os seus produtos, mas, mais uma vez, abdicamos de os criar em Portugal. Vamos comprar, com atraso e mais caro, o que podíamos ter feito aqui.

Mas estamos condenados?

Um cientista é sempre uma pessoa optimista. Nós não estamos condenados. O gene português é igual aos outros, tanto assim é que vemos que no estrangeiro os portugueses fazem igual ou melhor. Num ambiente asfixiante, as pessoas encolhem-se. Uma das consequências das nossas condições políticas e históricas é que as pessoas têm medo de falar.

Está de acordo que se deve ligar sobretudo o ensino às empresas e que as ciências teóricas têm uma utilidade menor?

Isso não faz sentido nenhum. Deixe-me atalhar logo isto: o conhecimento é um bem em si, independentemente de nos proporcionar conforto material. Ninguém vive feliz na ignorância e sem saber nada.

Não comunga da ideia de "felizes os pobres de espírito" [riso]?

Infelizes aqueles que acham isso. O problema da nossa pobreza não é material é de espírito. Não há ciência sem conhecimentos teóricos, nem sem querer saber. Perguntaram uma vez ao Einstein o que o distinguia das outras pessoas e ele respondeu que tinha "uma curiosidade apaixonada", que é uma maneira bonita de dizer insaciável. Todos queremos saber, mas o que caracteriza os bons cientistas é quererem sempre mais. Saber não é limitado a um certo domínio, é saber mais em tudo, mesmo nas ciências humanas. O homem faz parte do mundo, é natural que eu queira saber mais sobre ele. Cada vez mais percebemos que saber coisas sobre o mundo é saber coisas sobre o homem.

Por exemplo...

Quando queremos saber coisas sobre o cérebro percebemos que cada vez mais as ciências humanas comunicam com as outras: o cérebro é biologia, emoções, crenças, etc. Não faz nenhum sentido querer dividir as ciências entre úteis e inúteis. É uma separação feita pelos pobres de espírito.
 

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para ler o resto da entrevista... siga a ligação abaixo...

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